A tristeza de ter que defender aquilo que parece óbvio

Conversava com um amigo na hora do meu almoço. Dizia a ele que estou lendo o livro "Herege", Editora Cia. das Letras. Contei um pouco do testemunha da autora da obra. Em resumo, disse que ela morou em Meca. Que ela assistia execuções semanais por conta do desrespeito a "sharia". Que as mulheres eram educadas separadamente dos meninos. Que eles recitavam o Alcorão, e quando erravam ou não falavam com  convicção, apanhavam na boca. Também contei a ele do deslumbramento que a autora sentiu quando foi acolhida como exilada na Holanda. Como ela ficou encantada em ver que não havia execuções públicas. Que crianças não eram educadas com violência. Em saber que as mulheres podiam sair sozinhas de casa, trabalhar, estudar, e que não eram obrigadas a aceitar o espancamento dos seus maridos. Disse acerca da defesa que ela começou a fazer dos valores liberais, e do risco do islamismo aplicado. 

Curioso que o meu amigo não pareceu se sentir sensibilizado com a situação sofrida pelos jovens muçulmanos. O que ele fez foi questionar o porque eu achava que os tais valores ocidentais são mais corretos ou importantes do que aqueles que eram aplicados em Meca, pelos muçulmanos.

Na verdade, eu havia exposto o sentimento da própria autora quando conheceu um mundo diferente na Holanda.

De qualquer modo, confesso que isso causa uma sensação que não sei explicar. De repente, me vi tentando argumentar em favor do que parecia óbvio. De que não bater em crianças para recitar mantras religiosos, de que dar igualdade para meninos e meninas, que mulheres pudessem ter seu direito de não serem violentadas pelos seus maridos, entre outras coisas, era um sistema melhor (ou pelo menos, menos pior) do que o descrito no país islâmico.

Que ponto triste que chegamos! A fim de evitar preconceitos, acabamos por tentar igualar coisas completamente diferentes. Quanta miopia! Para evitar dizer que uma cultura é superior ou melhor que a outra, parece que colocamos vendas em nossos olhos, e nos impomos o dever de não fazer nenhum julgamento.

E não pensem que foi fácil defender o que parecia óbvio. Expor que a violência em se impor uma determinada forma de pensamento religioso era diferente da eventual violência utilizada para proteger quem tivesse sua consciência ou direito de livre crença ameaçado em um país ocidental. Para o meu amigo parece que eram a mesmíssima coisa. Que a mesma violência utilizada para impor valores muçulmanos era a mesma para impor valores ocidentais, entre nós, do tipo, direito de liberdade de expressão e os demais já mencionados. Que tudo não passa de questões culturais, nenhuma melhor ou pior que a outra.

Tentei apelar um pouco para o sentimento de empatia. Tentar se colocar no lugar de quem não tem, nestes lugares, direito a escolha, à voz, a deixar a religião em prol de outra ou de nenhuma, de não ter que se casar a força, enfim.

Triste tempo este que nós vivemos, o da absolutização do relativismo, em que nos vemos forçados a ter que argumentar em favor do óbvio, pois há quem até duvide que nós existimos.

A defesa do óbvio
pixabay


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