O justo Ló e a graça de Deus

Ló é chamado de justo nas Escrituras Sagradas (2 Pe 2.6-9), o que não deixa de ser curioso, diante do relato que o livro de Gênesis nos traz acerca de tal personagem.

O sobrinho de Abraão, por exemplo, colocou-se em precedência em relação ao seu tio (Gn 13.8-10). Quando se separaram, ele acabou escolhendo a melhor terra. Não é assim que deve se comportar um servo do Senhor, pois devemos considerar os outros superiores a nós mesmos (Fl 2.3). Ló poderia ter honrado Abraão.

Ló tinha um jeito muito estranho de resolver problemas complicados. Quando recebeu a visita de dois anjos, estes foram ameaçados pela população local, de serem abusados. O sobrinho de Abraão ofereceu suas filhas virgens para serem violentadas (Gn 19.6-7). Por maior que fosse o dever oriental de hospitalidade, tal atitude não merece elogios de modo algum!

Curiosamente, sua família não levava a sério as coisas que dizia. Ló procurou alertá-los da destruição do local. Eles, porém, achavam que Ló estivesse brincando (Gn 19.14). Deve ser muito estranho não ser levado  à sério em assunto tão importante. Talvez houvesse algo no comportamento de Ló que levou sua família a ter tal atitude.

Outra característica interessante de Ló é que ele tinha que ser "apertado" para fazer as vontade de Deus (Gn 19.15-16). As escrituras dizem que ele precisou ser pressionado para sair logo daquele local, a ponto de ser pego pelas mãos. Impressionante a misericórdia de Deus para com ele neste momento. Tem gente que é assim. Precisa ser apertado, pressionado, para fazer o que é necessário. Só vai, como se diz popularmente, por "livre e espontânea pressão".

Ló também era alguém retrucante, por assim dizer. O anjo mandou ele ir para um monte, porém ele questionou, e pediu para ir a uma cidade (Gn 19.17-20). Porém, não adiantou nada, pois logo acabou percebendo que era melhor mesmo ter ido para o monte (Gn 19.30). Para muitos, a vida é assim. Questionam tudo, retrucam, não aceitam conselho; e depois acabam tendo que aprender na prática, como descrito na famosa parábola do filho pródigo.

Infelizmente, pudemos ver pelo relato que o sobrinho de Abraão parecia não influenciar muito positivamente sua família. Por um lado, seus parentes achavam que ele gracejava quando estava na verdade falando sério (vers. 14). Depois, sua esposa, que em tese, deveria estar com o pensamento afinado com seu marido, acabou descumprindo a ordem angelical (vers. 26). Além disso, depois que tudo passou, suas filhas tiveram uma ideia mirabolante para suscitar descendência ao seu pai, cometendo incesto, demonstrando a influência que receberam no contexto da cidade em que foram criadas (vers. 3 em diante). 

Ou seja, podemos perceber que Ló pode ser tudo, menos um grande exemplo de homem de fé a ser seguido. Pelo menos é o que poderíamos pensar se nada mais fosse dito a respeito dele.

Entretanto, não é bem assim.

Em 2 Pe 2.6-9, Ló é chamado de justo!

Sim, um homem justo.

E isso porque ele atormentava a sua alma com o baixo nível de comportamento das pessoas ao seu redor.

Ló não era indiferente!

Ele poderia não ser perfeito, porém, sabia que as coisas não andavam bem naquele lugar, que não havia respeito ao ser humano, nenhum sentido de reverência, nenhuma noção de sagrado, a apoteose da libertinagem. 

E por conta desta postura, subjetiva, interior, que certamente redundava em clamor por parte de Ló, este foi considerado, pela graça, justo por Deus!

Assim somos nós também!

Podemos e somos completamente imperfeitos.

Cada uma das observações que foi feita sobre Ló talvez se encaixe em algum momento na descrição de nós mesmos.

Porém, se, pela graça de Deus, também não formos indiferentes, podemos ter o mesmo destino de Ló, sermos considerados justos por Deus, ou justificados.

Claro; as falhas não devem ser incentivo para relaxarmos, para falharmos ainda mais, porém podem ser uma fonte de consolo, no sentido de que não somos aceitos por conta de nossas performances, mas sim pelo puro amor de Deus.


Fonte da imagem: Sétimo Dia

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