A difícil questão da homossexualidade



Este vídeo aborda a discussão entre um pastor e um político australiano favorável a união gay, bem como o seu reconhecimento jurídico e social.

A questão tem sido tormentosa, e difícil para os que são contrários a tal união, tendo em vista que, os que argumentam de maneira favorável a ela o fazem com fundamento nos direitos humanos, na tolerância, na igualdade, no amor, entre outros valores que são completamente apoiados nas Escrituras Sagradas e na Tradição cristã. Ou seja, quem for contrário a tal união, passará, como de fato tem passado por intolerante e contrário àqueles valores, pelo menos nesta questão.

Neste vídeo, enquanto debate público, o político estava com o controle da palavra, e nitidamente, pode-se dizer que sagrou-se vencedor, e que o referido pastor não teve habilidade suficiente para convencer, seja o político, ou ao menos  sair-se bem diante da platéia.

Pensando um pouco em tudo o quanto foi dito neste debate, creio que alguns questionamentos deve ser feitos:

A primeira delas, conforme observou o político, é: será que a homossexualidade é uma condição genética, algo relativo ao nascimento de alguém na totalidade dos casos (o político defendeu que sim)? Embora haja grandes possibilidades de que seja realmente uma condição de alguns, parece que os estudos não são absolutamente conclusivos. E, ao que tudo indica, há casos em que pessoas viveram uma vida hétero, e em algum momento de suas vidas, partiram para uma experiência homossexual. Então, é possível concluir que também pode se tratar de comportamento livremente assumido.

Em segundo lugar, a questão da escravidão foi comparada, neste vídeo, a questão homossexual. Ou seja, o político argumentou que as Escrituras apresentam a escravidão como algo natural, deixando a entender que a Bíblia foi ultrapassada neste ponto pelas mudanças sociais, e que assim também deveria ser com a questão homossexual. Entretanto, é preciso pensar melhor neste ponto. Embora as Escrituras regulem algumas relações escravagistas, elas sempre consideravam o "status" de liberdade como algo melhor e mais desejável. Isso se reflete na própria experiência do povo de Israel em sua libertação do Egito. Ou seja, o natural é a liberdade, e não a escravidão. Por isso tantos cristãos puderam ser contra a escravidão nos EUA com a Bíblia em suas mãos. Houve inclusive, uma bula papal do século XVI que proibia a escravidão de qualquer ser humano. E ainda, o contrário da escravidão é a liberdade, e essa nunca foi chamada de pecado nas Escrituras. Em relação ao relacionamento sexual entre pessoas do mesmo sexo, a questão já é mais delicada, pois esta sempre foi tratada como pecado, seja nas Escrituras (mesmo a despeito de exegeses contemporâneas mais liberais), seja na Tradição.

De qualquer modo, do momento em que escrevo esta reflexão, imagino que esta questão será definida rapidamente nos próximos anos no ocidente. Parece inevitável que venha o reconhecimento do casamento civil homossexual na sociedade, pelo menos em uma sociedade de consumidores. Se dois indivíduos do mesmo sexo resolverem unir-se, independente do nome que se dê a tal união, o Estado acabará por regular esta relação, que, para uma sociedade capitalista, é fundamentalmente patrimonial, por mais sentimental que possa ser tal discurso (afinal, não é possível normatizar a afetividade, e sim somente o patrimônio).

Entretanto, por maior que seja a abertura em relação a esta questão, não vejo a possibilidade de cristãos conservadores considerarem como correta a relação sexual entre pessoas do mesmo sexo. Digo isso com o máximo respeito e amor, por conhecer a condição de pessoas homossexuais assumidos, e que são pessoas maravilhosas, e até mesmo pessoas muito inteligentes que defendem o contrário disso. 

Não há ponto nenhum nas Escrituras, nem na Tradição cristã em que o relacionamento sexual entre duas pessoas do mesmo sexo possa ter sido aventada como algo normal, não pecaminoso, ainda que feito com o consentimento de todos os envolvidos. Se ultrapassarmos este ponto, e considerarmos que tudo é possível, desde que haja consentimento, logo estaremos considerando como normal um grupo de pessoas se unirem sexualmente, por livre consentimento, e até mesmo começarmos a flertar perigosamente com a pedofilia, desde que possa haver relações com menores e que não tragam, em tese, nenhuma prejudicialidade a eles. A igreja deve ser um freio moral em relação a estas e outras tendências. A sociedade pode até pensar assim. A igreja, não.

Embora seja possível (mas não absolutamente conclusivo), cientificamente falando, que alguém nasça inclinado à homossexualidade, as Escrituras nos convidam a combatermos todas as tendências em nosso ser que possam ser contrárias àquilo que são seus mandamentos e prescrições morais (negue-se a si mesmo, tome sua cruz, e siga-me). Há pessoas que talvez nasçam inclinadas à ira, à pedofilia, ao adultério, ao roubo, entre outras coisas. Os seres humanos são chamados a uma verdadeira guerra contra a carne, que é vista como uma tendência pecaminosa, contrária a Deus. E essa carne se evidencia em todas as tendências, sejam hétero, sejam homossexuais.Parece-me de uma clareza cristalina que, o fato de alguém nascer com uma tendência sexual (genótipo) diferente de seu corpo (fenótipo)  seja um motivo de crise, de desarmonia. A sociedade hoje tem a tendência a considerar tal fato como algo que deve ser absorvido, conformado. A igreja convida cada pessoa a combater esta e outras tendências dentro de si, e tratar cada caso com tolerância, compreensividade e amor.

Além do que, é preciso saber que conceito de ser humano aceitaremos para a nossa vida. Se o ser humano é alguém que já é determinado ou é alguém que pode se auto-determinar. Se a primeira opção for a correta, ficará difícil responsabilizar alguém por qualquer tipo de ato, pois qualquer um poderá invocar a desculpa de que nasceu daquele jeito, ou que foi condicionado a isto ou aquilo pelo ambiente em que nasceu. Se o segundo for verdadeiro, significa que, não importam as tendências que nos influam, em algum momento podemos nos rebelar contra elas e escrever uma história diferente acerca de nós mesmos.

A história continuará sua marcha. Como disse, parece inevitável que as reivindicações dos grupos homossexuais sejam socialmente atendidas, e digo isso a curto prazo. E não somente a questão do casamento homossexual, mas um afastamento gradual da tradicional visão cristã de casamento. Muitas igrejas cristãs protestantes irão se acomodar aos novos tempos, talvez a maioria. A igreja católica e ortodoxa não mudará o seu ponto de vista nesta questão, por já ser definida pela Tradição (a tradição, para o protestantismo, não é algo imutável). Entretanto, haverá muitos gays, seja do povo, seja do clero, que continuarão se assumindo como católicos e ortodoxos e não verão contradição nenhuma nisso. Mas haverá uma minoria que continuará entendendo que o ato sexual entre pessoas do mesmo sexo continua sendo pecado.

Em tempo: uso a terminologia homossexualismo não por considerá-la doença, mas sim a mais adequada para refletir a prática sexual entre pessoas do mesmo sexo.

Comentários

  1. Muito bom texto Seino!!! Mas, como você chamou para a "briga"! (rsrs)
    1. Concordo com você, comparar a homossexualidade com a escravidão não parece ser uma comparação honesta e nem metodologicamente correta. Mas, de fato, depois das elucidações das ciências humanas sobre a escravidão, as sexualidades, e outras questões antropológicas, tratar apenas pelo viés da Bíblia pode conduzir ao velho erro do "suicídio da razão". Não que a Bíblia não tenha que ser levada em consideração, mas não como coisa pronta e dada. Até pode ser para um grupo de cristãos, mas não para todos, uma vez que as posturas teológicas são muitas (isso vc deixou bem claro).
    2. Você disse: "logo estaremos considerando como normal um grupo de pessoas se unirem sexualmente, por livre consentimento, e até mesmo começarmos a flertar perigosamente com a pedofilia". Na verdade isso já aconteceu na história. A literatura, por exemplo, está cheia de referências à "pedofilia" (assim, entre aspas, porque não tinha esse nome) e até a época de nossos avós, o casamento de "menores" era algo incentivado. Ou seja, a pedofilia, a poligamia, certos fetichismos devem sim ser levados ao contexto de seu tempo e de sua sociedade. Hoje é proibido. Antes não era. Amanhã não sabemos. Além do mais, devemos cuidar para não cair na falácia do "redutio ad absurdum". Poré, concordo, a Igreja (depende também de que igreja) deve manter alguma oposição e ser uma reserva moral, mesmo que muitos não gostem.
    3. Os dois conceitos de ser humano estão presentes em nossa vida e na história humana. Escolher uma ou outra e considerar a não escolhida como oponente, pode nos levar a outra falácia: a do 8 ou 80 ou falso dilema. Somos tão condicionados quanto livres. Um problema filosófico que, você ou eu, queiramos ou não, sempre redundará em uma aporia.

    Abraço e continue nos brindando com textos inteligentes e provocadores. Fala aqui não um amigo, mas um admirador.

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  2. Olá, Rogério, meu amigo e mestre! Obrigado pelo comentário. Nada há que eu possa acrescentar! Grande abraço!!!

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