São João Crisóstomo e seu pensamento sobre as riquezas
"Diz-me de onde vem tua riqueza? De quem a recebeste? E aquele de quem ele a herdou? Do avô, dir-se-à, do pai. Será que poderias, remontando às gerações, provar que esta posse é justa? Não poderias comprová-lo porque sua origem e raiz estão necessariamente associadas a uma injustiça qualquer. Por quê? Porque Deus, no começo, não criou, de um lado, ricos, e do outro, pobres... Ele deu a mesma terra a todos. Como é que se explica que, sendo a terra comum a todos, tu possuis uma tão grande quantidade de hectares, enquanto seu vizinho nem sequer possui um punhado? 'Foi meu pai', dizes tu, 'que me transmitiu tudo isso'. - E ele, de quem recebeu esta terra? -'De seus antepassados'. Mas se recuar bem atrás, vamos encontrar necessariamente a origem....
Quando alguém tenta apoderar-se de um bem para torná-lo seu, então, surgem as brigas, como se a própria natureza se indignasse pelo fato de que - enquanto Deus nos reúne os homens de toda a parte - nós nos dividimos por conta de nossas rivalidades, dilaceramo-nos por nossa necessidade de apropriação, reivindicando o teu e o meu - que são palavras congeladas. Neste caso, trata-se de hostilidade e aversão; mas,sem isso, deixa de haver hostilidade e rivalidade. Assim, é sobretudo, este estado de indivisão e não o outro que nos é hereditário, conforme a natureza...
Como é que o rico poderá ser bom? Isso é impossível; somos bons quando compartilhamos com os outros; somos bons quando nada detemos em nossa posse; somos bons quando damos aos outros; com efeito, enquanto detivermos a posse de alguma coisa, não poderemos ser bons".
(sobre a 1ª Epístola a Timóteo - Homilia 12, 4; PG 62, 562-564, apud LELOUP, Yean-Yves. Introdução aos Verdadeiros Filósofos. Ed. Vozes, p. 115-116).
O pensamento patrístico acerca das riquezas é bastante radical. Crisóstomo não parece admitir nenhuma possibilidade em ser rico e ser bom, ou justo. Entende que a raiz de toda a riqueza, em algum momento, irá remontar a algum ato injusto. Particularmente, entendo que podem existir exceções (ainda que raras), e que nem toda riqueza é de origem injusta, embora grande parte das vezes seja. De qualquer modo, o pensamento do grande bispo de Constantinopla serve de exortação para evitar todo acúmulo desmedido e estarmos sempre atentos com a questão do partilhar dos bens.
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